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Pesquisa aponta piora na qualidade de vida das crianças durante a pandemia da Covid-19

Uma pesquisa de mestrado realizada no Programa de Pós-graduação da Escola de Enfermagem da UFMG identificou, por meio de entrevistas com crianças de 7 a 9 anos que, para elas, a pandemia da Covid-19 teve repercussões em todos os domínios da qualidade de vida: bem-estar social, espiritual, psicológico, físico e no meio ambiente. Segundo o estudo, as crianças tiveram alterações de comportamento como ansiedade, alteração no apetite, no padrão do sono, irritabilidade, mudanças de humor e indisposição. Além disso, sofreram mudanças no desempenho escolar como desatenção, queda das notas, regressão, dificuldade de leitura e escrita e problemas de concentração.

desempenho escolarO estudo “Qualidade de vida de crianças de 7 a 9 anos em distanciamento social durante a pandemia por covid-19” é de autoria da enfermeira Juliana Barony da Silva, e teve como principal objetivo conhecer a qualidade de vida experienciada por essas crianças no contexto da pandemia e do seu próprio adoecimento. Foi um estudo qualitativo exploratório, onde a pesquisadora utilizou o conceito de Qualidade de Vida definido pela Organização Mundial da Saúde em 1994 como “a percepção do indivíduo de sua posição na vida, no contexto da cultura e sistemas de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações”.

Ao todo, participaram 24 crianças que tiveram diagnóstico positivo para infecção pelo vírus SARS-Cov-2 em Belo Horizonte. A coleta de dados foi realizada por videochamada, por meio de uma entrevista semiestruturada com questões sobre a repercussão do adoecimento e distanciamento social.

Durante a pandemia, segundo relato dos responsáveis, treze crianças (59,16%) apresentaram alguma alteração no comportamento e 20 crianças (83,33%) mudanças no desempenho escolar. Das crianças entrevistadas, 29,16% tinham algum tipo de comorbidade, sendo as mais comuns entre elas foram asma e bronquite. Em relação à instituição de ensino, 37,5% estudavam em escola pública e quinze 62,5% estudavam em instituições privadas. Das nove crianças que estudaram em instituição pública, sete delas não tiveram aulas on-line durante a pandemia, e por isso estudaram por meio de apostilas.

Segundo Juliana, a pandemia de Covid-19 trouxe preocupações sobre as repercussões do distanciamento social na qualidade de vida das crianças. Isso porque alterou a rotina, restringiu o contato social, intensificou a crise econômica e modificou suas condições de vida. “As principais fontes de informação que as crianças tiveram durante a pandemia foram: família, televisão, escola, vídeos. Poucos materiais informativos foram destinados efetivamente para as crianças. As informações que elas possuíram influenciaram na maneira como elas vivenciaram a pandemia. As crianças compreendem, à sua maneira, o que é o coronavírus e suas potenciais repercussões. Elas veem o vírus como “mau”. Por esse motivo é importante se atentar para as informações às quais as crianças têm acesso, uma vez que existe um alto número de notícias falsas circulando sobre o assunto. Além disso, as crianças experimentaram diversos sintomas negativos durante a pandemia, especialmente o medo e a circulação de noticias falsas podem potencializar esse medo. Uma das crianças disse que no inicio da pandemia pensou que se travava de "uma guerra mundial, que todo mundo morria”, relata.

Em decorrência do distanciamento social, a pesquisadora destacou que as crianças identificaram como aspectos positivos: ficar mais tempo jogando no computador, passar mais tempo com a família, estudar fora da escola e como e negativos: não poder passear, brincar sozinho, não ver os amigos, ter dificuldade nos estudos, ter que utilizar a máscara, diminuição das atividades físicas, aumento do tempo de tela, diminuição da renda familiar. “É importante ressaltar nessa pesquisa que, por vezes, o que para as crianças é visto como algo positivo (ficar no celular ou computador, estudar fora da escola), para nós adultos pode ser visto como algo negativo”, comenta.

Planejamento
De acordo com Juliana Barony, os governos devem reconhecer as necessidades das crianças e criar estratégias que garantam acesso à educação a todas elas, planos de contingência que minimizem os riscos do fechamento das escolas, disponibilização de dispositivos eletrônicos para crianças sem acesso aos mesmos, capacitação pedagógica dos professores que lidam com a educação nesse novo contexto e plano de acompanhamento psicológico dos alunos.

A pesquisadora ressalta, ainda, que é preciso estar preparado para atender crianças que vivem as consequências da pandemia. “Acredito que esta pesquisa pode ajudar a orientar enfermeiros e demais profissionais de saúde e professores da educação infantil a compreender os aspectos relacionados a mudanças de comportamento, desempenho escolar, alterações no desenvolvimento, demandas psicológicas e sociais das crianças. A partir desses dados, fica nítido que as mudanças de rotina e impossibilidade de realizar atividades ao ar livre e socializar, as necessidades de cuidado em relação à infecção pelo vírus têm potencial para afetar a qualidade das crianças”.

A enfermeira conclui que conhecer as repercussões da pandemia e adoecimento por covid-19 pela experiência das próprias crianças e pelo significado que elas atribuem a essas experiências pode dar pistas aos profissionais de como mudar concretamente o modo de cuidar.

Raio x da pesquisa:
Dissertação: Repercussões do distanciamento social e adoecimento por covid-19 na qualidade de vida de crianças de 7 a 9 anos
Autora: Juliana Barony da Silva
Orientadora: Elysângela Dittz Duarte
Defesa: 28/04/2022
Programa de Pós-graduação em Enfermagem